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DR literária

  • Foto do escritor: Bibiane Ferreira
    Bibiane Ferreira
  • 28 de fev. de 2022
  • 4 min de leitura

Atualizado: 27 de nov. de 2023


Alberto da Costa e Silva diz que somos todos coautores das obras que lemos, e que nelas nos pomos inteiros como naquelas que saem de nossas mãos*.

Acredito que meu percurso como leitora também é meu percurso de crescimento pessoal, e que as obras que li, escreveram minha jornada. Minha primeira tatuagem é uma homenagem ao primeiro livro que li por vontade própria. Quando criança, eu amava ler e amava que lessem para mim, estava sempre com livros de bichinhos nas mãos e ficava por horas a contemplá-los. Livros (que acompanhavam um CD) compostos por letras de músicas infantis, as quais eu dançava, cantava e decorava do início ao fim. Livros de contos para crianças que minha mãe lia todos os dias. Livros com fotos de animais de verdade. E assim foi minha infância: bichinhos, amor e diversão.

Depois veio a escola com seus livros obrigatórios: alguns eram tão legais que eu tenho guardados até hoje; outros tão maçantes que eu nem chegava a acabar e doava na primeira oportunidade. E assim foi minha vida escolar: matérias, professoras e colegas que eu fiz questão de guardar na memória; e outros que descartei inteiramente de minha mente sem nem hesitar.

Então veio minha pré-adolescência e a impaciência que a acompanha: eu não lia mais. Se tinha um filme, era inútil ler um livro que contasse a mesma coisa. E se não tinha filme, então não devia ser bom. A escola me esgotava. Lembro-me de levar um livrinho de umas 50 páginas que era leitura obrigatória para passar as férias na praia. No terceiro dia de leituras preguiçosas, o livro já tinha acabado. Minha prima, como uma boa leitora, levara dois livros gigantes com ela e disse que me emprestaria um deles. Com aproximadamente 500 páginas. Nunca havia passado pela minha cabeça ler um livro tão grosso igual aquele. Recusei. Dali algumas horas, aceitei. E essa foi minha ruína: eu acabava de sucumbir aos encantos dos livros enormes e, a partir de então, estava terrivelmente perdida no mundo literário.

Minha adolescência foi regada por livros que, por meros detalhes, não jorravam sangue nas viradas das páginas. A menina dos livros de bichinhos ainda estava viva e ainda não conseguia resistir a fotos e histórias de animais. A garota que era obcecada por cinema também continuava vivíssima e não perdia a oportunidade de assistir uma adaptação literária. Mas junto com elas, nascera outra pessoa, alguém que buscava, incessantemente, cada vez mais violência e histórias sobrenaturais. Alguém que já não era tão doce, nem tão impaciente com a quantidade de páginas, alguém que, por mais que odiasse admitir, adorava o ser diabólico que havia se tornado.

No entanto, de uns tempos para cá, a leitura vem sendo uma atividade muito remota, perdi a vontade, a inspiração, a energia... qualquer coisa que mova o espírito leitor. Não sei se posso culpar a faculdade por ter me sobrecarregado ou se é só por preguiça mesmo. Ler conteúdos para as cadeiras virou um completo sacrilégio - até então, nada muito surpreendente. Mas abandonar minha amada literatura? Sinto como se tivesse perdido uma parte de mim.

Nesses últimos tempos li alguns contos do Stephen King, alguns capítulos de um livro, metade de outro de autoria nacional... Tenho uma pilha enorme de livros inacabados dentro de meu guarda-roupas por dois motivos: não quero deixar na minha mesa para não empoeirar e minha mãe fazer um escândalo pela bagunça, e não quero guardar no meu armário de livros porque fica difícil de saber o que está “sendo lido” e o que não está. Enquanto isso, assisti inúmeras séries completas, temporadas que lançaram, filmes e vídeos, e até revi algumas coisas. Não posso culpar a falta de tempo. Acho que me tornei uma pessoa das facilidades, gosto de tudo que é prático e não exige muito esforço, e a leitura é para quem gosta de imaginar. E eu já imagino muitas coisas sem sentido e sem possibilidade de realização na minha vida.

Sinto que a quarentena de Covid-19 me trouxe de volta às origens: estou fazendo uma em cada cinco tarefas e voltei a ler um livro que começara há mais de um ano e não me lembro nem da metade, que dirá quem morreu e quem ainda está vivo. Mas eis aqui uma coisa que nunca faço de bom grado: reler. Sei que isso deve soar um absurdo para os fãs perfeitos dos livros, mas não me importo. Se não posso voltar na vida para recapitular as coisas ou reviver alguns momentos, então não vou fazer isso na ficção também, ainda mais com livros, já que eu demoro uma eternidade para ler um simples capítulo. Em compensação, parei de ver as séries em que estava viciada. Pensando bem, acho que meu problema não é a dificuldade, são as multitarefas. E pensando melhor ainda, acho que não tenho um único problema e sim vários que se dividem organizadamente em turnos e afazeres para que eu não tenha a mesma organização e disposição que eles. Às vezes, leio sentada comportadamente à mesa da cozinha durante algumas horas da madrugada. Às vezes, leio de pijamas, deitada toda torta na cama durante uma tarde inteira. Às vezes, leio cinco minutos antes de almoçar, ou depois de acordar, ou os dois ao mesmo tempo.

Em síntese, sou uma bagunça: literária ou não.




1 comentario


jvltoffoli
26 mar 2023

O que falar da sua escrita, simplesmente a cada post seu que leio, alguns trechos, parecem que arrancaram de mim e você os descreveu, ler seus manuscritos, é similar a ler a mim mesmo, crio empatia e simpatizo com a sua dor, sua dúvida, será a minha resposta, uma rainha de mágoas(faço umlink da música Queen of Sorrow da banda Black Label Society) e eu, me sinto um rei dos tolos em meio a minha escrita, as lágrimas que jamais pude chorar, se transformam na tinta das palavras que vou expurgar. Também tive momentos que estive distante da Literatura, hoje, ela é muito presente em minha vida e amo ler e desejo ler até o final dos meus dias e…

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